top of page
  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Ônus de Sucumbência em Embargos de Terceiro: quando o Embargado não deve ser onerado

  • Foto do escritor: Dejair Jorge Camargo Pereira
    Dejair Jorge Camargo Pereira
  • 20 de out.
  • 4 min de leitura

Por Dejair Jorge Camargo Pereira e Odila Borini Diotallévy, advogados jubilados e pós-graduados em Direito Processual

ree

Introdução – A condenação que desafia a lógica

A cena é recorrente nos tribunais: embargos de terceiro são julgados procedentes, e o embargado — que apenas exerceu seu direito — é condenado ao pagamento de honorários sucumbenciais. A lógica parece automática, quase ritualística. Mas será mesmo que a procedência dos embargos basta para impor ao embargado o peso da sucumbência?

E se ele não resistiu à alienação, mas apenas impugnou sua eficácia frente à execução previamente registrada? E se a controvérsia decorre da omissão do próprio embargante, que não registrou seu compromisso de compra e venda? A resposta não pode ser simplista. Ela exige reflexão, exige contexto, exige justiça.


O caso que inspirou a reflexão

Em processo recente, os embargados promoveram execução fundada em contrato de honorários advocatícios inadimplido. Para garantir o crédito, realizaram averbação premonitória nas matrículas dos imóveis dos devedores. Posteriormente, um terceiro — que havia firmado compromisso de compra e venda não registrado — lavrou escritura pública e opôs embargos de terceiro.

A controvérsia não girou em torno da validade da alienação, mas sim da oponibilidade de seus efeitos frente à execução previamente averbada. Os embargados não resistiram à venda, mas impugnaram a tentativa de sobrepor um contrato obrigacional não registrado à publicidade registral da execução.

Não houve má-fé. Não houve resistência à alienação. Houve apenas o exercício legítimo de um direito processual, amparado pela legislação e pela jurisprudência. E, ainda assim, veio a condenação em honorários.


Fundamentos jurídicos e doutrinários – ponto a ponto

1. Averbação premonitória e presunção de boa-fé

O art. 828, §4º, do CPC é claro: a averbação premonitória afasta a presunção de boa-fé do terceiro adquirente. Isso significa que, ao adquirir o imóvel, o embargante tinha ciência da existência da execução. A boa-fé, portanto, não pode ser presumida — e a proteção registral do embargado deve prevalecer.

2. Ineficácia da alienação frente à execução

O art. 792, IV, do CPC estabelece que a alienação posterior à averbação é ineficaz perante o exequente. A discussão, portanto, não é sobre a validade do negócio jurídico, mas sobre sua oponibilidade. O embargado não impugna a venda — impugna sua eficácia frente à execução.

3. Registro como elemento constitutivo da propriedade

O art. 1.245, §1º, do Código Civil reforça que a propriedade só se transfere com o registro. Sem ele, o contrato é inoponível a terceiros. O embargante, ao não registrar o compromisso de compra e venda, assumiu o risco da ineficácia — e não pode transferi-lo ao embargado.

4. Modulação equitativa dos honorários

O art. 85, §8º, do CPC permite ao juiz modular os honorários quando o valor da causa é elevado ou o proveito econômico é irrisório. Mais do que isso: permite que o julgador considere a conduta das partes, a complexidade da controvérsia e o exercício regular de direito.

5. Exercício regular de direito

O art. 188, I, do Código Civil afirma que o exercício regular de direito não constitui ato ilícito. O embargado, ao impugnar a oponibilidade da alienação, não agiu com abuso, má-fé ou resistência injustificada. Agiu dentro dos limites legais — e não deve ser penalizado por isso.


Jurisprudência – ponto a ponto

1. Súmula 303/STJ

A súmula afirma que “em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários”. Mas quem deu causa neste caso? O embargado, que apenas executou um contrato legítimo? Ou o embargante, que não registrou sua aquisição e ignorou a averbação premonitória?

2. Tema 872/STJ – REsp 1.452.840/SP

O STJ reconhece que os honorários devem ser fixados com base no princípio da causalidade. Isso significa que a sucumbência não decorre da procedência, mas da conduta que deu origem à controvérsia. E nesse caso, a controvérsia nasceu da omissão do embargante.

3. REsp 1.870.399/PB

Neste precedente, o STJ admite a modulação equitativa dos honorários em embargos de terceiro. Reconhece que há casos em que a condenação automática é injusta — e que o julgador deve considerar o contexto, a boa-fé e o exercício regular de direito.

4. REsp 2.141.417/SC

O tribunal reafirma que a promessa de compra e venda sem registro não é oponível a terceiros, mesmo que anterior à penhora. A proteção registral é objetiva — e o embargado, ao se apoiar nela, não pode ser penalizado por resistir à tentativa de sobreposição contratual.


Onde está a indefinição?

A jurisprudência oferece caminhos, mas a prática ainda se prende à formalidade. A procedência dos embargos de terceiro costuma gerar condenação automática em honorários, sem análise da conduta das partes ou da origem da controvérsia.

Essa postura ignora que, em muitos casos, o embargante não registrou o compromisso de compra e venda, agindo com imprudência frente à matrícula já averbada. Ignora também que o embargado não agiu com má-fé, mas apenas exerceu seu direito de forma legítima.


Caminhos possíveis

O enfrentamento da questão exige estratégia e coragem argumentativa:

  • Petição autônoma: com base no princípio da causalidade e no art. 85, §8º, CPC, requerendo modulação ou exclusão da sucumbência

  • Embargos de Declaração: para provocar o enfrentamento do tema e prequestionar dispositivos legais

  • Recurso Especial: para levar a questão ao STJ, com base nos precedentes citados e na necessidade de uniformização da jurisprudência


Conclusão – Quando a justiça exige mais do que a regra

Não é justo. Não é razoável. E tampouco é jurídico. A condenação automática em honorários sucumbenciais, em embargos de terceiro, quando o embargado apenas exerceu seu direito, é uma distorção que precisa ser enfrentada.

A modulação da sucumbência não é exceção — é justiça. Quando há controvérsia legítima, boa-fé processual e exercício regular de direito, o julgador deve olhar além da formalidade da procedência e aplicar os princípios que sustentam o sistema: causalidade, proporcionalidade e razoabilidade.

Enquanto o tema não for enfrentado com a profundidade que merece, seguiremos entre súmulas e temas — mas ainda sem resposta definitiva.

 
 
 

Comentários

Avaliado com 0 de 5 estrelas.
Ainda sem avaliações

Adicione uma avaliação

Contato: Dra. ODILA BORINI DIOTALLÉVY

 
 
 
 
Ícone Instagram.png
Facebook_Logo-removebg-preview.png

instagram.com/odiladiot

facebook.com/odiladiot

bottom of page